[okfn-br] Palavra Aberta?

Arthur Serra Massuda a.serramassuda em gmail.com
Segunda Abril 29 20:12:29 UTC 2013


Obrigado por levantar esses pontos, Felipe.

Precisamente, quando o jornalismo é um mau negócio e a democracia precisa
de debate, como pensar o debate público a partir de todos os progressos
sociais? Se os "pensadores" de economia e administração tentam modelos de
negócio viáveis, porque "pensadores" da democracia não podem fazer uma
proposta de organização? Por causa do contexto da crise do jornalismo tais
reflexões ganham importância. Obrigado por lembrar.

O que mais me horroriza hoje é que as opções parecem ser entre "liberaliza,
ou norte-koreíza". Se o liberalismo é incapaz de saciar as necessidades da
democracia (ver e-mails anteriores), vamos melhorar o que ele já construiu.
Não é assim que funciona o ideal iluminista de progresso? Uma das
necessidades da democracia é o debate público. Nele, na minha opinião, uma
imprensa livre, plural e diversa é indispensável, num momento em que ela
definha e parece mais atentar contra a democracia do que defendê-la. Como
garantir isso?

V. me pegou num ponto fraco. Nos últimos meses tenho me incomodado de
desenvolver um pensamento que, embora desenvolvido com bases foucaultianas,
dialoga com o do Zizek. Vou usar o Zizek em um ponto específico, mas não
vejo como referência intelectual sua fúria destrutiva. Imagino que sua
recomendação se refira a essa característica desestabilizadora do
pensamento de Zizek. Quanto a isso, não poderia concordar mais, que fique
na academia. Quando for para discutir política na prática, precisamos ser
construtivos, não irônicos e arrogantes.

Abraços,


2013/4/29 Felipe M Pait <felipe.pait em gmail.com>

> O fato é que imprensa é cada vez menos um bom negócio. Um uso pouco
> rentável do capital. Porque a tecnologia está tornando a distribuição do
> conteúdo muito fácil e barata. Pelo mesmo motivo, o controle da midia pelo
> dono do veículo está se tornando ineficaz. Ser dono da marca "Planeta
> Diário" dá menos poder, e nenhum dinheiro. Quem quiser faz jornalismo, sem
> precisar de patrão. O jornalismo vai bem, mas os jornais vão mal.
>
> Então o controle da mídia pelos sovietes, se vier, vai ter que vir através
> da polícia e da censura. A ocupação da fábrica de papel-imprensa pelo
> Partido não vai ser suficiente para controlar a imprensa. Ou liberaliza, ou
> norte-koreíza. Não vai haver meio termo, nem o estamento nem a tcheka
> conseguem dirigir a imprensa através de doações semiabertas aos blogs
> governistas. Veja por exemplo o caso da China: o mundo inteiro, até -
> pasmem! - os próprios chineses, sabe da corrupção dos dirigentes do Partido
> lendo o NYTimes e Bloomberg - que obtiveram as informações de fontes
> abertas. Meu palpite: a China vai abrir, a Rússia vai fechar, a Argentina
> vai continuar em crise por mais 100 anos, e o Brasil com a graça de Deus
> vai continuar essa bagunça que amamos.
>
> E aviso aos navegantes! O trabalhos dos assim-chamados "pensadores"
> zizekistas são só para render publicação, obter alvará de pesquisador da
> Capes, pode citar para fazer Lattes mas não existe a recomendação de
> espalhar para fora da academia, nem para a "reality-based community".
>
>
>
> On 26 Apr 2013, at 12:12 PM, Arthur Serra Massuda <
> a.serramassuda em gmail.com> wrote:
>
>
> A (in)capacidade é a mesma, mas as instituições em torno não. Não é
> preciso convencer ninguém se as regras orientam essas capacidades dentro de
> um jogo. E como é o jogo do debate público? Jornalistas falando sobre o
> mundo dentro da imprensa sobretudo privada. Isso é um modelo liberal, não
> precisa convencer ninguém, é só entrar no jogo que já está funcionando.
>
> Eu basicamente argumento que esse jogo foi criado a partir de princípios
> de mercado, não princípios democráticos. Meu mestrado analisa o modelo de
> debate público democrático recomendado pelo sistema interamericano de
> liberdade de expressão: é cópia e cola do liberalismo utilitário, fundado
> na economia política, pensando na harmonia social a partir da competição e
> dos interesses.
>
> Esses não são princípios democráticos. (Pensar democracia a partir da
> gestão de interesses conflitantes é não pensar na diversidade de sujeitos
> de direito que buscam reconhecimento social - minorias, movimentos, povos
> tradicionais, grupos identitários. A democracia deveria estar mais
> preocupada na ampliação da noção coletiva respeito social e menos em
> defender interesses, na minha concepção - que é a de Axel Honneth.) Como
> pensar a imprensa a partir da democracia, não do mercado, é o atual desafio
> da liberdade de expressão. Veja bem, não se trata de estatizar, mas de
> democratizar, expandir valores e regras democráticas para os diferentes
> espaços sociais. Eu escolhi o debate público. E essas foram algumas das
> minhas conclusões.
>
> Quanto tiver tempo, gostaria que você fosse mais clara nos valores
> discordantes, seria muito importante para a elaboração da minha dissertação
> ter esse feedback.
>
> Abraços,
>
>
>
> 2013/4/26 Heloisa Pait <heloisa.pait em gmail.com>
>
>> Li e achei o que você escreveu fascinante. Discordo completamente, mas
>> você realmente resumiu a questão. Parabéns!
>>
>> Estou inclusive escrevendo um artigo sobre os dilemas do liberalismo no
>> Brasil e aí está; a ideologia liberal não convence ninguém. Na prática, no
>> dia-a-dia, somos libertários. A capacidade que eu tenho de mandar na minha
>> faxineira e nos meus alunos se equipara à capacidade do reitor da UNESP em
>> mandar na minha vida. Cada um faz nesse país o que lhe dá na telha.
>>
>> Mas a ideologia não nos desce a goela.
>>
>> Obrigada!
>>
>> On 26/04/2013, at 11:35, Arthur Serra Massuda <a.serramassuda em gmail.com>
>> wrote:
>>
>> > Condicionar esse controle a algumas necessidades da democracia (desde
>> os mais clássicos, como a regulamentação do direito de resposta, até alguns
>> mais ousados, como a diversidade ou eleição do conselho editorial)
>> significa sim ir contra a livre iniciativa, pois diminui a influência do
>> proprietário no próprio negócio. Se essas organizações como Millenium e
>> Palavra Aberta conseguirem conceber que livre iniciativa, assim como
>> liberdade de expressão, não é um valor absoluto, tenho certeza que uma
>> aliança seria possível.
>>
>>
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