[okfn-br] Lei de acesso à informação: barreiras no Setor Público

Leandro Salvador leandrosalvador em gmail.com
Sexta Dezembro 27 21:10:29 UTC 2013


Oi Vitor, tudo bem?

Meu Caro, concordo ipsis literis com a tua análise. Acho que é por aí
mesmo, ninguém quer que informações (realmente) sigilosas ou pessoais
tornem-se públicas. O que a LAI faz, da perspectiva do servidor que está
entre a cruz e a espada, entre 500 anos de cultura de obscurantismo e a
Transparência Pública, é dizer-lhe que, a partir de 17.mai.2014 ele não
terá mais que consultar todos os níveis hierárquicos possíveis para decidir
se abre, ou se fecha, uma informação. A partir de então, ele terá à sua
disposição (em tese) uma publicação com o rol de informações sigilosos e
pessoais devidamente catalogadas e identificadas. Bastará, então, cotejar a
informação solicitada com o catálogo, sem grandes temores e inseguranças.
Evidentemente, o servidor deverá ter bom senso para perceber que poderão
existir informações que, pelos motivos mais diversos e toscos possíveis,
possam não ter sido devidamente identificadas e catalogadas e, nesses
casos, justificar a não abertura. Só que inverte a mão...

Se antes qualquer responsável por Serviço de Informação ao Cidadão (SIC)
sente-se inseguro e desprotegido por não ter base material para decidir
sobre a sigilosidade ou privacidade de determinada informação, tendo que
ponderar, a seu próprio juízo, entre a LAI e punições administrativas caso
"erre a mão", passados os dois anos de vigência da LAI (17.mai.2014), o
juízo deixa de ser subjetivo e passa a ser, também ele, material. Deixa de
ser necessário consultar os "oráculos" superiores hierárquicos, e passa a
ser possível consultar os tais catálogos de informações sigilosas e
pessoais. Com isso, pelo menos a nível administrativo, uma garantia podemos
ter: o servidor que decidir abrir uma informação solicitada, passa a tar
(i) a LAI e (ii) o catálogo de referência, à sua disposição... além (iii)
do seu próprio bom senso. Eventualmente, se uma chefia tosca decidir punir
o servidor, a luta entra em outro patamar: "por que é que a sigilosidade ou
privacidade daquela informação aberta não estava devidamente catalogada?".

O jogo muda um pouco, em favor da transparência. O que não falta são casos
em que órgãos públicos decidem, "ad hoc", por razões das mais impublicáveis
possíveis, trancafiar informações obviamente públicas. Após o esperado
17.mai.2014, pelo menos, se quiserem trancafiar, terão que declarar e
justificar à priori. Mas podemos apostar que isso vai dar pau: o que não
faltam são órgãos públicos deliberadamente desorganizados, o que é
excelente para a manutenção de práticas obscurantistas.

Concorda(m) com esse raciocínio Meu Caro?
Abração!






Em 26 de dezembro de 2013 11:30, Victor Pimenta <vpzim em hotmail.com>escreveu:

> Olá Leandro, beleza?!
>
> Vou discordar um pouco, mas só pra problematizar mesmo. No fundo, concordo
> com boa parte da sua leitura.
>
> Com a nova legislação de acesso à informação, há três "tipos" de sigilo:
> (a) *informações sigilosas nos termos da LAI *(incisos do art. 23), (b) *informações
> pessoais* ou (c) *informações sigilosas conforme legislação específica *(art.
> 22).
>
> A classificação das informações nos graus reservado (5 anos), secreto (15
> anos) ou ultrassecreto (25 anos) é realizada apenas em relação às
> informações sigilosas nos termos da LAI (primeiro caso acima). Nesse caso,
> como você disse, o espírito da LAI é mesmo que as informações sigilosas
> sejam todas classificadas formalmente e listadas em rol publicizado na
> Internet.
>
> O que ocorre, porém, se for solicitada uma informação que seja realmente
> sigilosa nos termos da LAI (art. 23), mas que não esteja formalmente
> classificada? Pelo que entendi, sua sugestão é que essa informação deveria
> ser considerada de acesso público.
>
> Nesse ponto que sugiro a reflexão, justamente porque, pelo rigor da lei,
> somente podem ser consideradas sigilosas informações que efetivamente
> coloquem em risco a segurança do Estado ou da sociedade.  Assim, a ausência
> de ato formal de classificação da informação de caráter sigiloso não deve
> resultar na disponibilização da informação ao público, pois o prejuízo
> final seria da própria sociedade.
>
> Basta pensar em exemplos de informações sigilosas para perceber o absurdo
> que seria sua disponibilização pela ausência de classificação prévia:
> localização de testemunhas sob proteção; plantas de unidades prisionais;
> dados sobre investigações sigilosas em curso, etecetara.
>
> De fato, como você colocou, a LAI estabelece que os documentos
> classificados como secretos e ultrassecretos devem ser reavaliados até maio
> de 2014 - caso contrário, serão de acesso público. Foi a forma que o
> legislador encontrou para "ameaçar" os gestores e garantir que essa
> reavaliação seja feita (para quem sabe ter os sigilos reconsiderados ou
> os prazos reduzidos). Mas o tiro pode sair pela culatra, pois, por sua
> natureza, informações secretas e ultrassecretas não podem - a princípio -
> vir a público de maneira alguma. Isso vai dar uma baita confusão =)
>
> Enfim... a reavaliação de documentos e a publicação de rol de informações
> sigilosas são realmente instrumentos da sociedade para dialogar e
> pressionar o poder público para a melhor aplicação da LAI. Mas deixo meus
> cents para mostrar que, em muitos casos, a coisa pode ficar mais complexa...
>
> Abs,
> Victor Pimenta
>
> ------------------------------
> From: leandrosalvador em gmail.com
> Date: Wed, 25 Dec 2013 23:53:41 -0200
>
> To: okfn-br em lists.okfn.org
> Subject: Re: [okfn-br] Lei de acesso à informação: barreiras no Setor
> Público
>
> Olá Pessoal, tudo bem?
>
> A LAI estabeleceu que dia *17.mai.2014* será um grande dia! É o dia em
> que, conforme seu artigo 39, todas as informações que não tiverem sido
> classificadas, "serão consideradas, automaticamente, de acesso público"
> (vide seu § 4o). Daí, a luta será em cima do rol de informações e
> documentos classificados, e não mais no caso-a-caso como é hoje.
>
> Será bonito, porque o servidor público terá à sua disposição uma
> publicação binária: ou o documento X é classificado, ou não é. Ponto.
>
> Segue o recorte, para quem porventura divirta-se com isso... =)
>
> Ah, é claro, não custa especular que, provavelmente, apesar de um prazo de
> dois anos, se muito, esse trabalho refinado, que poderia ter sido
> planejado, será feito no último mês do prazo, na emergência de sempre. Pelo
> menos em alguns governos, é certeza que está sendo feito assim (não está
> sendo feito ;).
>
> Abraços!
>
> ===
>
> LAI<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12527.htm>
> :
>
> Art. 39.  Os órgãos e entidades públicas deverão proceder à reavaliação
> das informações classificadas como ultrassecretas e secretas *no prazo
> máximo de 2 (dois) anos*, contado do termo inicial de vigência desta Lei.
>
> § 1o  A restrição de acesso a informações, em razão da reavaliação
> prevista no caput, deverá observar os prazos e condições previstos nesta
> Lei.
>
> [...]
>
> § 3o  Enquanto não transcorrido o prazo de reavaliação previsto no caput,
> será mantida a classificação da informação nos termos da legislação
> precedente.
>
> § 4o  As informações classificadas como secretas e ultrassecretas *não
> reavaliadas no prazo previsto no caput serão consideradas, automaticamente,
> de acesso público*.
>
> ===
>
> Art. 30.  A autoridade máxima de cada órgão ou entidade *publicará,
> anualmente*, em sítio à disposição na internet e destinado à veiculação
> de dados e informações administrativas, nos termos de regulamento:
>
> I - rol das informações que tenham sido desclassificadas nos últimos 12
> (doze) meses;
>
> II - *rol de documentos classificados em cada grau de sigilo, com
> identificação para referência futura*;
>
> [...]
>
> § 1o  Os órgãos e entidades deverão manter exemplar da publicação prevista
> no caput para consulta pública em suas sedes.
>
> ===
>
>
> Em 25 de dezembro de 2013 23:13, Yasodara Cordova <
> yasodara.cordova em gmail.com> escreveu:
>
> hahaha. É muito engraçado isso. Pedir gentileza no pedido formal de uma
> informação. O cara tá fazendo o trabalho dele, você o seu.. E ainda tem que
> ser "simpático".
>
> hahahah.
>
> "Oie, queria fazer um pedidozinho. Tem uns mapinhas que tô fazendo que são
> mó legais, mas tô precisando de um negocinho pra finalizar. O senhor tem
> aí?""
>
> kkkkkkk
>
>
> 2013/12/25 Gabriela Nardy <gabileitao em gmail.com>
>
> Concordo com você Rabatone. E sobre o seu ponto 1, eu e mais algumas
> pessoas tentamos falar isso com ele e explicar que o "secreto" é exceção, e
> não regra, mas o medo de "e se eu publicar algo que eu não devia?" é tão
> grande que acaba interferindo em todo o processo, sabe?
>
> o que eu senti por parte dele (mas vale lembrar que foi um único cara) é
> um medo e uma desconfiança muito grande, além de uma visão diferente da
> nossa (por exemplo, ele achava que o cidadão não deveria poder fazer o
> pedido anonimamente, e que o governo deveria saber quem estava pedindo os
> dados e o que a pessoa faria com eles). É toda uma cultura que precisa ser
> modificada.
>
>
> Em 25 de dezembro de 2013 16:12, Diego Rabatone <diraol em diraol.eng.br>escreveu:
>
> Na realidade eu acho que essas questões já estão definidas Heloísa, pelo
> menos "legalmente".
>
> Isso pois:
> 1) A LAI é muito clara e explícita em dizer que tudo é público a menos que
> seja explicitamente definido como "secreto".
>
> 2) A LAI  também é bem clara ao dizer que o funcionário que se negar a
> fornecer alguma informação deve sofrer punições administrativas - ela só
> não define quais são essas punições.
>
>
> Assim, na dúvida, o dado é público e deve ser fornecido, e, no meu
> entender, se o funcionário está em dúvida e quer "evitar punição" ele
> deveria fornecer o dado (a lei pende para essa leitura). Se alguém for
> punido (indevidamente) por ter essa postura, quem o puniu é que deveria ter
> problemas.
>
> Para além disso, sei que a Controladoria Geral do Município de SP está
> fazendo uma série de cursos e treinamentos com os funcionários da
> Prefeitura para esclarecer e conscientizar os funcionários (tanto da letra
> da lei quanto de suas intenções e importância).
> Acho que esse trabalho de educação é absolutamente fundamental de ser
> feito em todas as esferas, inclusive para respaldar os funcionários contra
> "chefes" "mal intencionados".
>
>  Talvez um passo interessante fosse realizar atividades de formação dessas
> com funcionários e "pessoas comuns" (não servidoras) para estimular o
> diálogo nesse sentido.
>
> Concordo com você, Gabriela, de que não é uma questão pessoal e que eles
> não deveriam olhar por esse lado.
> Mas também acho que seria muito bom se nós pudéssemos enviar um email de
> pedido de informação de maneira mais coloquial/informal, dialogando com uma
> pessoa.
>
> Mas, olhando pelo nosso (sociedade civil) lado, e pensando nos pedidos que
> eu já fiz, eu mantenho o tom formal e "burocrático" por entender que muitas
> vezes "do lado de lá" (odeio essa dicotomização!) existem funcionários que
> não querem fornecer os dados a não ser que "sejam obrigados" (pela Lei), ou
> por entender que meu pedido será "melhor bem tratado" se for feito dentro
> de um certo "padrão de linguagem formal".
>
> Meus cents. ;)
>
>
> --------------------------------
> Diego Rabatone Oliveira
> diraol(arroba)diraol(ponto)eng(ponto)br
> Identica: (@diraol) http://identi.ca/diraol
> Twitter: @diraol
>
>
> Em 25 de dezembro de 2013 12:39, Heloisa Pait <heloisa.pait em gmail.com>escreveu:
>
> Puxa, muito bom Gabriela!
>
> O caminho então seria:
>
> 1. definir o que NÃO pode ser divulgado; e
> 2. deixar claro os custos para a NÃO divulgação de dados.
>
> Pois se o cara tem medo de pecar por um lado, seria legal ele saber que
> não divulgar também traz custos. E aí ele teria que como regra abrir, e se
> não abrir vai precisar se ancorar em algum lugar.
>
> Do jeito que está, pelo que vocês estão descrevendo, o modo "default" é o
> segredo. O modo confortável, que terá custo zero para os envolvidos.
> Precisamos mudar o modo default para a abertura.
>
> Isso que eu disse não exclui uma coisa mais positiva, de explicar, dizer
> como fazer, treinar, etc. Mas acho que se não inverter o defaut, não
> adianta o cara estar super informado; é uma questão de incentivos e é
> racional não abrir.
>
> Heloisa
>
> Abraço,
> Heloisa
>
>
> 2013/12/25 Gabriela Nardy <gabileitao em gmail.com>
>
>  Sobre essa questão dos servidores, a fala de um funcionário público no
> ENDA chamou bastante a minha atenção (infelizmente não lembro o nome dele).
> Ele falou 3 coisas sobre a dificuldade de atender aos pedidos de acesso à
> informação:
>
>    1. que quem recebe os pedidos são pessoas, não máquinas, e que por
>    isso precisamos ser mais educados e tratá-los melhor (ele bateu nesse ponto
>    diversas vezes e falou que isso muitas vezes é um entrave). Tentei
>    argumentar que isso não era uma questão pessoal, mas de direito do cidadão,
>    e que não fazia sentido os servidores se sentirem pessoalmente ofendidos
>    com pedidos muito "secos", mas ele se mostrou irredutível.
>    2. que se um servidor disponibilizar algum dado que não poderia ter
>    sido publicado, quem arca com a responsabilidade é ele, individualmente, e
>    não o orgão ou setor como um todo. Isso gera um medo muito grande e faz com
>    que, na dúvida, eles prefiram não disponibilizar.
>    3. que eles não receberam nenhum tipo de treinamento sobre a LAI e
>    que, entre outras coisas, não está claro pra eles o que pode ou não ser
>    disponibilizados (o que agrava o 2 ponto).
>
>
>
> Em 24 de dezembro de 2013 11:42, Victor Pimenta <vpzim em hotmail.com>escreveu:
>
> superavitário
>
>
>
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